Idolatria política: onde isso pode nos levar?
Desde as eleições de 2002 estamos cada dia mais observando um processo de idolatria política bastante preocupante, principalmente através das redes sociais, através da qual pessoas manifestam abertamente opiniões sem limites.
foto: Divulgação/arquivo pessoal
Idolatria
política: onde isso pode nos levar?
Helton
Kramer Lustoza
Procurador
do Estado
Professor
do Curso de Direito da UNIPAR
www.heltonkramer.com
Nesta última
quinta-feira, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidiu que
os quatro processos da operação "lava jato" contra o ex-Presidente
Lula - que tramitaram em Curitiba – deveriam ter sido enviados à Justiça
Federal do Distrito Federal. Com esse entendimento, o Plenário do Supremo
Tribunal Federal formou maioria para manter a decisão da 2ª Turma da Corte que
declarou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro para julgar o ex-presidente Lula no
caso do tríplex do Guarujá.
Acima de
questionamentos sobre a interpretação processual jurídica deste assunto, temos
que analisar um grande problema social, que é a necessidade do povo brasileiro
idolatrar personagens em momentos históricos.
Desde as eleições de
2002 estamos cada dia mais observando um processo de idolatria política
bastante preocupante, principalmente através das redes sociais, através da qual
pessoas manifestam abertamente opiniões sem limites. Basta uma publicação
contrária ao seu entendimento, e logo aparecem os internautas comentando com
seus adjetivos estereotipados.
Não desejo elogiar ou criticar os personagens, apenas quero chamar a atenção do leitor para o fato de que a idolatria está atrapalhando o amadurecimento democrático do povo brasileiro. Neste cenário, a crítica política se transforma em uma espécie de heresia, sendo que as redes sociais estão aí para provar que, no mundo, existe um choque intenso de ideias e opiniões, principalmente quando assunto é política. É neste cenário que as admirações populares se tornam instáveis e voláteis, de modo que as pessoas ficam oscilando para aquilo que acreditam e defendem. E ao encontrar um novo personagem, tornam-se fiéis seguidores, não importando o que este ídolo faça ou defenda.
A ideia aqui
defendida não é de um cidadão apático, é claro que cada um pode possuir seus
políticos e visões preferidas, porém, não deveriam idolatrar os ‘santos’
milagreiros da política ou da justiça. Não podemos esquecer que se eles estão
ali é por que foram eleitos ou passaram por algum concurso e, todos têm o
compromisso de fazer o seu trabalho de forma proba e eficiente, não se
resumindo em um favor à sociedade.
Adorar personagens em
vez de pensar a política de forma racional e crítica é algo infantil. Utilizar
símbolos e frases prontas não significa patriotismo, nem representa a
democracia. É preciso compreender que democracia é muito além de uma eleição,
significa defesa das instituições democráticas, defesa dos direitos
fundamentais, respeito à saúde pública, fortalecimento da economia e combate a
desigualdade social.
E o pior de tudo
isso é que a discussão do “Direito” se transformou em questão de opinião, com um
grau elevado de “emotivação” de argumentos não racionais. Não se critica o
aspecto da democratização das discussões jurídicas, mas sim a inversão dos
valores conquistados pela democratização do país. Tudo isso, pode ser resultado
da fraqueza institucional aliada à nossa memória fraca sobre a história do
Brasil.
Diante de
tantos fatos absurdos, as pessoas se sentem como se estivessem em meio de um tiroteio: depois do primeiro
tiro, já ninguém sabe quem está atirando e em quem! E somos bombardeados com
tantos fatos desse gênero nos noticiários do dia a dia, que me sinto na
responsabilidade de reafirmar o óbvio. Parece loucura, mas é preciso defender a
legitimidade das instituições democráticas, de modo que tenham força para sair
desta crise constitucional.
Não existe outra forma legítima de
vencer um contexto tão adverso se não pelas vias democráticas escolhidas
previamente pela Carta Constitucional. Pois como defendeu John Locke: “onde
termina o Direito, inicia a tirania”. Em palavras mais específicas, a
legitimidade das soluções deverão estar subordinadas ao Direito, e é o Direito
que corrige os problemas sociais, e não o contrário.
Essa crise constitucional será ainda
mais agravada se não houver respeito entre as autoridades públicas: juízes,
procuradores, advogados, governantes, políticos, etc. A solução não é
inalcançável, só não devemos esperar um salvador da pátria, nem idolatrar um
determinado personagem que aparecer com discursos milagrosos. Não devemos
esperar que alguém em específico salvará o país, mas a saída legítima para
crise constitucional está no respeito de todos à Constituição Federal.
E como eu afirmei
anteriormente, falei apenas o óbvio! Mas as vezes, como escreveu Clarice
Lispector, “o óbvio é a verdade mais difícil de se enxergar”.
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